Após receber a incubência de aprimorar os improvisos realizados no Exercício do GETA - "Confissões" -, cada um de nós escolheu o texto que mais havia lhe tocado, de alguma forma. E, por se tratar de uma doente terminal que sofre diante da incerteza do tempo que lhe resta, o improviso de Hermínia havia me emocionado bastante pela condição da personagem lançada à própria sorte, precisando lidar não somente com circunstâncias que não podia controlar, mas também com as conseqüências de suas próprias escolhas.
Depois de reler várias vezes a transcrição do texto, percebi que, para me integrar melhor ao personagem, precisava sentir e compreender sua situação física e psicológica, ou seja, saber como um tumor no cérebro afeta a vida de uma pessoa. Descobri que essa doença atinge diversas áreas da mente, mas as duas possibilidades que mais me encantaram como estratégia de construção dramatúrgica foram a perda de memória e da capacidade de organização da linguagem. Então, procurei realizar dois trabalhos para conseguir esse resultado: primeiro, retirar elementos da história, abrindo lacunas na compreensão plena dos fatos que eram contados; e segundo, desorganizar um pouco a linguagem, quebrando a lógica de certos eventos e inserindo elipses por meio da escolha de palavras que se referissem a situações posteriores. A combinação destes dois foi extremamente útil na tentativa de proporcionar uma atmosfera de fluxo de consciência, imperfeito na sua capacidade de comunicar plenamente aquilo que a personagem deseja, como se sempre houvesse mais elementos perdidos na mente da protagonista.
Acredito que meu trabalho foi uma “desdramaturgia”, onde a retirada de elementos do texto e a desorganização da narrativa podiam se constituir como uma forma de realçar a confusão vivida pela personagem, de modo que o espectador, mergulhando abruptamente nesse universo inconsciente e perturbador, também se sentisse um pouco desnorteado. Como se a emoção do espectador surgisse não somente da história que ela conta, mas de um sentimento de impotência diante de uma pessoa que não consegue mais se comunicar integralmente nem consigo mesma, nem com o mundo. Mesmo que tudo o que ela tenha contado não seja real, mas uma invenção da sua mente, aquela era a única verdade que ela conseguia encontrar e acreditar naquele instante.
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ResponderExcluirQue coisa bonita de se ler, Márcio! Fiquei encantada como você fez a concepção da minha confissão. Me dá muitos elementos para pensar e trabalhar. Acho que foi uma experiência nova essa “desdramaturgia” pra você e vai ser muito gostosa de fazer para mim!!!
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